07 maio 2010

Carta para o Enzo

Faz tempo que estou querendo te escrever, filho. Vai calhar que agora é Dia das Mães, mas não é por isso que a carta está sendo escrita agora. É porque o amor é tanto que não está dando mais pra guardar, eu PRECISO colocar para fora.

Bom, quando puderes ler isso, tu já vais saber que nunca fui uma mãe normal. Desde o começo, minhas expectativas sempre foram diferentes das expectativas da maioria das mães.

Depois de um certo ponto da gravidez, eu não torcia ansiosamente para que tu nascesse rápido. Eu queria era que tu ficasse o mais tempo possível dentro da barriga, para o teu próprio bem. Mas tu não quiseste, e lá fomos nós começar o desafio de aprender juntos a fazer tudo diferente.

Ao contrário das outras mães, eu não estava ansiosa para ter alta e ir pra casa. Porque eu sabia que tu não irias comigo.

Eu não estava ansiosa para trocar tuas fraldas. Eu queria que tu pudesse começar a usá-las, assim como as dezenas de roupinhas que aguardaram no armário mais de mês para poderem começar a entrar em uso - e muitas das quais nunca serviram (por ficarem grandes demais, também ao contrário do que costuma acontecer com a maioria das crianças).

Eu sonhava com o dia em que poderia te fazer dormir no meu colo, e não com a noite em que tu dormirias no teu berço. Sonhava com o dia em que poderia te pegar sem fios, sem pressa, sem ter que te devolver para a incubadora. Aliás, na primeira semana, queria era poder tirar tudo o que cobria o teu rosto e finalmente poder olhá-lo em detalhes, coisa que eu só fazia por uns raros minutos por dia.

E todos esses momentos vieram, e todos só aumentaram a felicidade que nasceu no dia em que eu soube que tu existias em mim.

E continuamos, quase três anos depois, na nossa rotina diferente de mãe e filho: esperei um pouco mais pelos teus passos, ainda mais pelas tuas palavras. Hoje, espero pelas palavras que não sejam apenas repetição pura e simples. Espero poder ouvir de ti como foi teu dia na creche, quem são teus melhores amigos, quais as tuas brincadeiras preferidas.

Espero pelo dia em que não precisaremos mais de vitaminas, remédios, terapias e consultas. Nem dos exames de sangue, ah, benditos e extenuantes exames, e sempre eu para te segurar, com o coração partido e um sorriso para disfarçar. Mas duvido que tu não perceba a dor dentro dos meus olhos, quando a gente se olha e sei, intimamente, que nós dois nos perguntamos: precisa mesmo isso? Sim, a gente sabe que precisa.

Mas essa minha vida de mãe não tem apenas expectativas adiadas – até porque eu sei que esses dias todos também chegarão. Tem momentos de amor e alegria infinitos.

Tu me surpreendes a cada dia ao aprender letras e números e músicas. Com o teu carinho, teu abraço pela manhã e teus pulos na minha barriga, para depois encostar a cabeça no meu umbigo e dizer: "ai ,que todoso".

Tu me fazes feliz com teus pulos incertos, com tua gargalhada ao me ouvir no telefone, com tua doçura estendida a todos que encontras no caminho. Com teu olhar deslumbrado pelo mundo, e com teu olhar observador, como quem capta mais do que consegue expressar, talvez mais do que devia. Com teu amor incondicional por mim. Com teu choro ao me perceber irritada. Com tua paciência.

Tu me ensinas com teus exemplos. De persistência, de coragem, até de teimosia. Contigo e por ti, aprendo a lutar pelo que é importante, pelo que é necessário, pelo que vale a pena. Aprendo a esquecer rápido aquilo que não prestou. Aprendi e aprendo a sorrir. Mesmo que esteja doendo.

E esse texto é pra dizer que, não sei como, eu ando ainda mais apaixonada por ti. Eu achava que já te amava com todo o amor que eu podia dar, mas descobri que não. Que, por ti, é sempre possível ir além.

Daquele tipo de amor que faz o dia cansativo e estressante virar nada quando chego em casa e te coloco na tua cama e converso contigo, na esperança que tu ouças enquanto dormes e possas entender um pouquinho do que sinto.

Do tipo de amor que faz meu dia mais feliz só de lembrar de ti. Que faz a gente sentir o cheiro e ouvir a voz da pessoa amada. Que dá uma saudade de doer o coração, ainda que faça poucas horas que a gente tenha se despedido.

Tu me fazes uma pessoa melhor e, mais importante, fazes eu realmente querer ser melhor. E eu tenho tentado, muito. Eu não sei se o Dia das Mães precisava existir. Mas quero criar um Dia do Filho pra ti. Tenho certeza que tu mereces mais do que eu.